terça-feira, 13 de julho de 2010

FUTEBOL: RETRATO DA VIDA

Cultura/Coluna Opinião, Gazeta do Oeste
Nota publicada em 11 de julho de 2010

No dia seguinte a derrota do Uruguai para a Holanda vi na Internet registro no jornal "El Pais" de Montevideo sobre os festejos populares após o jogo e a manchete: "Uruguai ganhou nas ruas, em que pese não ir à final". Na Argentina o povo recebeu carinhosamente em Buenos Aires a seleção derrotada por 4 x 0, no jogo contra a Alemanha. O presidente da CBF de lá, Julio Grondona, declarou ao "Clarin", que Maradona seria mantido como técnico e "poderia fazer o que queira". Comparei as reações na Argentina e no Uruguai e a forma de recepção da seleção no Brasil, sob
vaias e apupos, com a exceção dos gaúchos, conterrâneos de Dunga. Foram esquecidos os méritos de Julio Cesar, Lucio, Kaká, Robinho e tantos outros. Não se trata de encobrir a decepção do torcedor. Porém, humanamente será justo omitir as alegrias que todos eles já proporcionaram ao Brasil? O próprio "vilão" Luis Fabiano, minutos antes do lance infeliz do gol contra, dera o passe mágico para Robinho abrir o placar. Nada disto vale?
Será que não houve nenhum esforço em 2010? Ou, se repetiu a tradição de serem apontados "vilões" nas horas de derrotas, cujos exemplos foram Toninho Cerezo, crucificado na Copa de 1982, pelo passe errado que deu no lance que originou o segundo gol da Itália; Zico em 1986 ao perder um pênalti contra a França, que daria a classificação ao Brasil; Ronaldo o "fenômeno" em 1998 pelo fraco desempenho na derrota contra a França (3 x 0), recuperado quatro anos depois como artilheiro do penta na Coréia do Sul e Japão; e Roberto Carlos em 2006 ao ajeitar a meia no instante do gol francês de Thierry Henry, que nos valeu a eliminação.
O futebol é o retrato 3 x 4 da vida. Para encobrir interesses e salvar aparências praticam-se atos injustos. No final, quem "paga o pato" são técnicos e jogadores. Na vida humana acontece a mesma coisa. O que se apresenta ao público não é, regra geral, o que deveria ser apresentado. A opinião pública desinformada reage, muitas vezes, levada pela emoção e responsabiliza o mais fraco. Qualquer que seja a situação, não se pode jogar na lata do lixo o talento, o trabalho criativo, a lealdade, por razões que não sejam aquelas ditadas pelos sentimentos da tolerância e respeito. A seleção brasileira não morreu. Napoleão Bonaparte afirmava, que para ganhar uma guerra são necessários bons soldados, armas e muita sorte. No futebol, bons jogadores, bom técnico e a sorte que faltou ao Brasil este ano. Por isto, o revés foi apenas uma etapa, a ser superada. Costumo repetir que a ingratidão e a inveja são irmãos siameses. Se o Brasil não aplaude Dunga e seus comandados, também não deve desprezá-los. Eles fizeram muito pelo nosso futebol. Somente a inveja e a ingratidão tentam desconhecer. Dunga, o capitão da seleção, que em 1994 levantou a
taça de campeão da Copa do Mundo. Em 1990, ele fora qualificado como "jogador sem talento". Quatro anos mais tarde era destaque na conquista do tetra campeonato. Questionei o "estilo Dunga" como técnico, porém reconheço que sob o seu comando e a presença de quase todos os jogadores atuais, o Brasil se classificou para ir à África, além de conquistar a Copa América em 2007 e a Copa das Confederações, em 2009.
Por condenar a ingratidão e a inveja - o chamado "talento" dos medíocres - não compartilho com a onda de condenações à nossa seleção. Mesmo triste e surpreendido pela derrota, ela merece voto de louvor, por ter continuado o sonho do nosso futebol, cujo futuro continua promissor.

Ney Lopes - Jornalista, advogado e ex-deputado federal

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