segunda-feira, 4 de julho de 2011

O amargo 'Pão de Açúcar'

Opinião, O Poti
Artigo publicado em 03 de julho de 2011

P arece que o ex-ministro Palocci deixou o governo, mas não deixou de prestar eficientes consultorias. O empresário Abílio Diniz, a pretexto de criar empregos e assinar a carteira de trabalho dos seus empregados, se habilita para receber R$ 4 bilhões de empréstimo do BNDES, com juros subsidiados, com a finalidade de fundir a sua empresa Pão de Açúcar com o conglomerado francês Carrefour. Enquanto isto, o cidadão comum paga juros exorbitantes no cheque especial.

A "engenhosa" transação tem lances inexplicáveis. Por exemplo, os maiores beneficiários serão os acionistas franceses. Sabe por quê? O Carrefour brasileiro em 2010 deu prejuízo de R$ 500 milhões. Na fusão, o patrimônio será supervalorizado e os acionistas da matriz francesa ganharão muito dinheiro. Estima-se que o lucro por ação passaria de R$ 2,80 para R$ 4,70. O BNDES financiará inclusive a compra de ações do Carrefour na França.

O objetivo do Pão de Açúcar é contornar um acordo, assinado em 2005 com a empresa francesa"Casino", que assumiria o controle acionário da cadeia de supermercado brasileira em 2012. Segundo o advogado do "Casino", a família Diniz fez negociação secreta com o Carrefour e estaria usando prestígio com o governo brasileiro para pressionar os franceses. A intimidade do Senhor Abílio Diniz com a Presidente Dilma foi demonstrada no dia 25 de junho de 2010, quando a sua mulher, Geyze Diniz, em plena campanha presidencial, ofereceu um chá da tarde, em São Paulo, para a candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff. Convidou esposas de empresários. O objetivo era reverter as pesquisas, que apontavam na área empresarial paulista, 43% de preferência por Serra e 27% por Dilma.

Por coincidência, na última quinta, o sr. Abílio Diniz participou no Palácio do Planalto, na condição de membro efetivo, da primeira reunião da Câmara de Competitividade e Gestão, coordenada pelo empresário Jorge Gerdau. Cabe a esse órgão, criado na época do ministro Palocci, evitar qualquer risco de concentração econômica. Só em São Paulo, a megafusão em análise controlará 47% do mercado. Aliás, o Sr. Jorge Gerdau, que preside a Câmara de Competitividade e Gestão, conhece muito bem de monopolio. A empresa dele integra o chamado "cartel do vergalhão" e recebe reiteradas acusações, de que constrange, com ameaças, importadores de aço de excelente qualidade, cerca de 30% mais barato do que o preço praticado pelo grupo Gerdau. Essa Câmara está muito parecida com o refrão popular de "colocar a raposa dentro do galinheiro"!!! Sabe-se que o BNDES passa por dificuldades pelo risco da inflação e a Copa do Mundo que vem aí com a necessidade de R$ 40 bilhões de financiamentos. Como se explica esse braço amigo do governo para ajudar a família Diniz? Ninguém acredita mais no "conto do vigário" de que é para a criação de empregos. Toda operação desse tipo levou a demissões em massa. O que acontece com o Pão de Açucar e o Carrefour é o contrário do capitalismo, que condena monopolios e pune concentrações danosas ao consumidor. Por fim, há uma perguntalocal que não pode deixar de ser feita. Quem ajudou ao grupo de supermercado Nordestão, quando chegou ao RN a multinacional Walmart, que adquiriu a rede Bom Preço? A ajuda não veio de empréstimos subsidiados da BNDES. Veio da gestão eficiente, que manteve a cadeia tupiniquim aberta, gerando e mantendo empregos, sem onerar recursos públicos. Isto sim é capitalismo e livre concorrência! Como diz José Simão na Folha, o temor é que essa megafusão vire um "carrefurto". Ou que ela se transforme num "amargo pão de açúcar" para empurrar goela abaixo do consumidor o "pão que o diabo amassou".

Ney Lopes, jornalista, advogado, professor de direito constitucional e ex-deputado federal, escreve neste espaço aos domingos.

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